Wednesday 26 September 2007

Percepções e Paradigmas

Estou neste momento a ler o livro "The 7 Habits of Highly Effective People", de Stephen Covey. É um livro que se lê surpreendentemente bem, quase como um romance. Aparentemente, pelo título, parece ser apenas mais um livro de auto-ajuda, do género "Get Rich and Successful in Seven Small and Simple Steps", mas é muito mais que isso. Pessoalmente, posso dizer que está a ajudar-me a conhecer-me a mim próprio.

O que me saltou imediatamente à vista é o impacto que diferentes percepções da realidade podem ter até na formulação dos próprios problemas. O autor dá o exemplo de um pai que entra com os seus filhos numa carruagem do metro de Nova Iorque. As crianças começam a fazer a maior confusão, incomodando e irritando os outros passageiros, correndo e gritando. O pai senta-se e age como se nada se passasse. A situação chegou a um extremo tal que o passageiro que estava sentado ao lado do pai das crianças lhe disse algo como "Peço desculpa, mas os seus filhos estão a incomodar os outros passageiros. Não acha que os devia controlar melhor?" Ao que o pai das crianças respondeu: "Provavelmente tem razão, devia fazer alguma coisa. Mas sabe, acabamos de vir do hospital, onde a minha esposa morreu há uma hora. Eu não sei o que pensar, e parece que os meus filhos também não conseguem lidar com a situação."

Podem imaginar qual a reacção do primeiro passageiro. O que aconteceu aqui? Uma total e completa mudança de paradigma. O passageiro passou a ver a realidade de uma forma radicalmente diferente. A formulação do problema deixou de ser "Como fazer com que estas crianças se calem e se aquietem?" e passou a ser "O que fazer para ajudar este pai e estas crianças a lidarem com a dor da perda de um ente querido?" É este o poder da modelação multidimensional: a análise de um facto sob diferentes perspectivas pode levar a uma total mudança de paradigma.

O que é, então, um paradigma? Trata-se da forma como nos apercebemos da realidade e da forma como entendemos que ela deve ser. Trata-se da fusão de valores e de princípios. Isto faz-me reflectir sobre um dos problemas mais graves das sociedades contemporâneas. Hoje, os valores são tidos como muito mais importantes que os princípios. As pessoas e as organizações definem os seus objectivos a curto prazo, em função dos seus valores dissociados dos seus princípios, sem terem consciência de quem são e de onde estão. São incapazes de compreender qual a sua missão e de definir estratégias eficazes. O imediatismo e a facilidade são a regra. Mesmo que venham a ter sucesso, serão infelizes e frustradas, porque se esqueceram de quem são.

Na verdade, seremos tanto mais felizes e bem sucedidos, enquanto pessoas e enquanto organizações, quanto mais os nossos valores estiverem alinhados com os nossos princípios.

Este é o papel do Business Intelligence, o nosso papel. Ajudar as organizações e as suas pessoas a perceberem quem são e onde estão. A fazê-las mudar de paradigma. Só assim será possível dar o passo seguinte: definir para onde querem ir. Em suma, ajudá-las na arte de bem definir os seus problemas.

3 comments:

Zézinha_Trig said...

FANTÀSTICO, vais longe Filipe, estás maduro e consegues perceber para além do que te ensinam. Continua por favor.

Rui Cunha said...

Filipe está espectacular o exemplo das crianças no comboio relativamente à abordagem que podemos ter dos problemas se mudarmos a nossa perspectiva...sabes que ao ler o teu comentário estava a pensar no seguinte: apartir daquele momento, cada vez que esse passageiro se deparar com a mesma situação das crianças,como irá agir? influenciado pelo último contexto que viveu (das crianças estarem a libertar-se emocionalmente de um stress emocional)? ou seguindo o seu senso comum que lhe diz que o comportamento das crianças é incorrecto?

Filipe Nunes said...

Obrigado pelo teu comentário, Rui.

Creio que o passageiro passaria a ter ambas as dimensões presentes se se deparasse com uma situação semelhante. Por um lado, a dimensão relativa ao comportamento aparente das crianças. Por outro lado, a dimensão que ele desconhecia até então, relativa ao seu estado emocional.

Do cruzamento destas duas dimensões, ele passará a ver o problema de uma forma completamente nova, o que lhe permitirá avaliar diferentes abordagens de resolução e mesmo de formulação do problema, que desconhecia.

O comportamento das crianças continuará a ser problemático, mas, tendo em conta esta nova dimensão emocional, poderá concluir que existe um outro problema de nível emocional, mais acima na hierarquia de problemas, e, portanto, de resolução prioritária.